domingo, 1 de fevereiro de 2009

Rosa Parks


Ficando de pé para a liberdade."A única coisa que me incomodou foi ter esperado tanto tempo para fazer este protesto"A maioria dos historiadores datam o início do movimento moderno dos direitos civis nos Estados Unidos de 1º de dezembro de 1955. Este foi o dia que uma costureira desconhecida de Montgomery, Alabama, recusou-se a levantar para ceder o assento de um ônibus para um passageiro branco. Esta brava mulher, Rosa Parks, foi presa e multada por violar um decreto da cidade, mas seu ato solitário de desafio foi o início de um movimento que acabou com a segregação legal na América, e fez dela uma inspiração para as pessoas amantes da liberdade de muitos lugares no mundo.Rosa Parks nasceu “Rosa Louise McCauley" in Tuskegee – Alabama, filha do carpinteiro, James McCauley e da professora, Leona McCauley. Aos dois anos, ela foi morar no sítio dos avós, em Pine Level, com sua mãe e Sylvester, seu irmão caçula. Aos 11 anos, ela se matriculou na Escola Industrial de Montgomery para garotas, uma escola particular fundada por mulheres nortistas, de tendência liberal. A filosofia da escola de auto-valorização era consistente com a opinião de Leona McCauley em levar vantagem das oportunidades, não importando quão poucas fossem.As oportunidades eram poucas de fato. “Atrás delas” . Em uma entrevista, Rosa Parks disse: Nós não temos quaisquer direitos civis. Era apenas uma questão de sobrevivência, de existência de um dia para o outro. Eu me lembro, quando ia dormir, de uma garotinha ouvindo a “Ku Klux Klan” rondando à noite, e ouvindo um linchamento, e com medo de que a casa viesse abaixo pelo fogo.Na mesma entrevista, ela citou sua longa convivência com o medo como a razão de sua intrepidez em decidir apelar para suas convicções, durante o boicote aos ônibus.“ Eu não tinha qualquer espécie de medo e foi um alívio saber que eu não estava só.Depois de ter trabalhado na Faculdade Estadual de Professores do Alabama, a jovem Rosa e seu esposo Raymond Parks estabeleceram-se em Montgomery. O casal se juntou à agencia local da NAACP e trabalhou sigilosamente por muitos anos para melhorar a sorte de afro-americanos da segregação racial do Sul.“Eu trabalhei em numerosos casos com a NAACP, recorda a sra. Parks, mas não queríamos publicidade. Houve casos de chicoteamento, trabalhos forçados, assassinatos e estupros. Não parecia que tínhamos muito sucesso. Era mais uma questão de tentar desafiar as autoridades para mostrar que não desejávamos mais continuar sendo cidadãos de segunda classe.O incidente do ônibus conduziu à formação da Associação para o Progresso de Montgomery, liderada pelo pastor da Igreja Batista da Avenida Dexter, Dr. Martin Luther King Jr. A associação conclamou um boicote contra a empresa de ônibus da cidade. O boicote durou 382 dias e chamou a atenção mundial para a causa de Rosa Parks e do pastor King . A decisão da Suprema Corte americana derrubou o decreto municipal de Montgomery, sob o qual A Sra. Parks fora multada e declarou ilegal a segregação racial nos transportes públicos.Em 1957, a sra. Parks e seu marido se mudaram para Detroit no Estado de Michigan onde ela serviu no staff do deputado John Conyers. A Convenção Sulista de Lideranças Cristãs estabeleceu o prêmio Anual Rosa Parks de Liberdade em sua honra .Após a morte de seu marido, em 1977, Rosa fundou o Instituto de Auto-Desenvolvimento Rosa e Raymond Parks. Este Instituto patrocina um programa de verão anual para adolescentes chamado “ Veredas da Liberdade”. Os jovens fazem um tour pelo país, em ônibus, sob supervisão de adultos, aprendendo a história do país e dos movimentos dos direitos civis.O Presidente Clinton presenteou Rosa Parks com a Medalha Presidencial da Liberdade em 1996. Em 1999, Ela Recebeu uma Medalha de Ouro do Congresso Americano.Quando perguntada se ela era feliz com a vida de aposentada, Rosa Parks respondeu: Eu fiz o melhor que poderia fazer para encarar a vida com otimismo e esperança e para olhar para frente por dias melhores, mas eu não penso que há tal coisa, como a felicidade completa. Dói em mim que ainda há atividades da Klan e racismo. Eu acho que quando você diz que você é feliz, que você tem tudo que precisa, e tudo que você quer, e não há nada mais para desejar. Eu digo que ainda não alcancei esse estágio.A Sra. Rosa Parks passou seus últimos dias vivendo tranqüilamente em Detroit, onde morreu em 2005, com a idade de 92 anos.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

A construção da vida

Em tempos idos esta era a imagem da rua principal de Alpiarça, será bom, será sempre bom, os desejos de ter
acção critica, à geração presente, desejando com isso um melhor desempenho para as novas oportunidades que a democracia veio proporcionar, mas na critica deverá estar sempre presente um factor de aceitar participar, nas coisas que no dia a dia, fazem a diferença para melhor, no bem estar, daqueles que nas condições adversas, tudo fizeram para por à nossa disposição, novas ferramentas, que permitem, apesar de toda a contestação legitima, alcançar novas metas, para os vindouros, que eles próprios jamais pensaram poder existir. O homem, tem apesar de tudo, vindo a abrir novos horizontes, de exigência, por vezes pensando que se se esquecer do passado ( do seu passado ) poderá desenvolver em si, uma nova imagem de progressista, de moderno e até de sabedor de coisas.
É pois aí que a coisa falha, a construção permanente do dia a dia que faz futuro, só pode ser dignificante se lhe juntarmos, toda a aprendizagem das coisas que fizeram as alegrias e as tristezas dos nossos progenitores, para as podermos aplicar em prol do bem comum

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Esperança




Discurso de Barack H. Obama, em português, proferido a 20 de Janeiro de 2009.

Caros concidadãos:
Apresento-me hoje aqui sentindo-me humilde perante a tarefa que nos aguarda, grato pela confiança que depositaram em nós, consciente dos sacrifícios por que passaram os nossos antecessores. Agradeço ao Presidente Bush pelos serviços prestados ao nosso país, bem como pela generosidade e cooperação que deu provas durante este período de transição.
Quarenta e quatro presidentes americanos prestaram até hoje o juramento presidencial. As suas palavras foram proferidas em tempos grandiosos de prosperidade e períodos tranquilos de paz. Contudo, houve também ocasiões em que o juramento foi prestado entre nuvens que se avolumavam e tempestades violentas. Nesses momentos, a América prosseguiu o seu caminho não apenas devido à capacidade e visão dos que ocuparam este alto cargo, mas porque nós, o povo, permanecemos fiéis aos ideais dos nossos antepassados e aos nossos documentos fundadores.
Assim foi. E assim será com esta geração de americano.
Que estamos a braços com uma crise já todos compreenderam. O nosso país está em guerra contra uma rede poderosa de violência e ódio. A nossa economia está enfraquecida, uma consequência da ganância e irresponsabilidade por parte de alguns, mas também da nossa incapacidade colectiva de fazer escolhas difíceis e preparar o país para uma nova era.
Perderam-se casas, extinguiram-se empregos, fecharam-se empresas. O nosso sistema de saúde é demasiado oneroso; as nossas escolas reprovam demasiado; e cada dia traz mais provas de que as formas como utilizamos a energia reforçam os nossos adversários e ameaçam o nosso planeta. São estes os indicadores da crise, objecto de dados e números estatísticos. Menos mensurável mas não menos profunda é a diminuição da confiança em todo o país - um receio perturbante de que o declínio da América é inevitável e de que a próxima geração tem de reduzir as suas ambições.
Hoje digo-vos que os desafios que defrontamos são reais. São graves e são muitos. Não terão resposta fácil nem num curto espaço de tempo. Mas que todos fiquem sabendo: terão resposta.
Neste dia, reunimo-nos aqui porque escolhemos a esperança em vez do medo, a unidade de objectivos em vez do conflito e da discórdia.
Neste dia, viemos proclamar o fim de querelas mesquinhas e falsas promessas, das recriminações e dos dogmas gastos que durante demasiado tempo sufocaram a nossa política.
Continuamos a ser uma nação jovem, mas nas palavras das Escrituras, chegou o momento de pôr de parte as infantilidades. Chegou o momento de reiterar a firmeza do nosso espírito; de escolher o melhor da nossa história; de levar por diante essa dádiva preciosa, essa ideia nobre passada de geração em geração: a promessa divina de que todos são iguais, todos são livres e todos merecem a oportunidade de lutar pela sua quota-parte de felicidade.
Ao reafirmar a grandeza da nossa nação, compreendemos que essa grandeza nunca é um dado adquirido. Tem de ser conquistada. A nossa jornada nunca foi feita por atalhos nem se contentou com pouco. Não foi um caminho trilhado por cobardes - por aqueles que preferem o lazer ao trabalho ou que procuram apenas os prazeres da riqueza e da fama. Foi antes trilhado por aqueles que aceitam os riscos, os executores, os que fazem - alguns célebres, mas na maior parte das vezes homens e mulheres que trabalharam na obscuridade - e que nos conduziram por um caminho longo e difícil até à prosperidade e à liberdade.
Por nós, embrulharam os seus poucos haveres e atravessaram os mares à procura de uma vida nova. Por nós, trabalharam duramente em oficinas e colonizaram o Oeste; sofreram chicotadas e lavraram a terra dura.
Por nós lutaram e morreram, em lugares como Concord e Gettysburg; Normandia e Khe Sahn.
Vezes sem conta, estes homens e mulheres lutaram e sacrificaram-se, e trabalharam até que as mãos sangrassem para que nós pudéssemos ter uma vida melhor. Viram a América como sendo maior do que a soma das nossas ambições individuais; maior do que todas as diferenças de nascimento, riqueza ou facção.
É este caminho que prosseguimos hoje. Continuamos a ser a nação mais próspera e mais poderosa da Terra. Os nossos trabalhadores não são menos produtivos do que quando a crise começou. A nossa mente não é menos criativa, os nossos bens e serviços não são menos necessários do que eram na semana passada, no mês passado ou no ano passado. A nossa capacidade não foi diminuída. Mas o nosso tempo de imobilismo, de proteger interesses mesquinhos e de adiar decisões desagradáveis - esse tempo passou definitivamente. A partir de hoje, temos de nos levantar, sacudir a poeira e recomeçar a tarefa de refazer a América.
Porque para qualquer lado que olharmos, há trabalho que tem que ser feito. O estado da nossa economia exige acção, ousada e rápida, e nós agiremos - não apenas para criar novos empregos mas para lançar as novas fundações do crescimento. Construiremos as estradas e as pontes, as redes eléctricas e os circuitos digitais que alimentam o nosso comércio e que nos ligam uns aos outros. Devolveremos à ciência o lugar a que tem direito e utilizaremos com eficácia as maravilhas da tecnologia para aumentar a qualidade dos cuidados de saúde e reduzir os seus custos.
Aproveitaremos o sol, os ventos e a terra para alimentar os nossos carros e fazer funcionar as nossas fábricas. E transformaremos as nossas escolas e universidades para responderem às exigências de uma nova era. Tudo isto sabemos fazer. E tudo isto faremos.
Agora, há quem ponha em dúvida a escala das nossas ambições - quem insinue que o nosso sistema não pode permitir muitos e grandes planos. Têm a memória curta. Porque se esqueceram do que este país já realizou; do que homens e mulheres livres podem alcançar quando conjugam a imaginação e o objectivo comum, a necessidade e a coragem.
O que os descrentes não conseguem compreender é que o chão mudou debaixo dos seus pés - que os velhos argumentos políticos que nos consumiram durante tanto tempo já não se aplicam. A pergunta que hoje fazemos não é se o nosso governo é demasiado grande ou pequeno, mas se funciona - se ajuda as famílias a encontrar empregos e um salário decente, serviços que possam custear, uma reforma digna. Se a resposta for sim, tencionamos seguir em frente. Se a resposta for não, os programas serão terminados. E aqueles de nós que administram os dinheiros públicos serão responsabilizados - para gastarem com sensatez, reformarem velhos hábitos e gerirem os nossos interesses com transparência - porque só então poderemos restaurar a confiança indispensável entre um povo e o seu governo.
Também a pergunta que se coloca não é se o mercado é uma força do bem ou do mal. O seu poder para gerar riqueza e difundir a liberdade não tem paralelo, mas esta crise lembrou-nos que sem um olhar vigilante, o mercado pode descontrolar-se - e que um país não pode prosperar durante muito tempo quando favorece apenas os mais prósperos. O sucesso da nossa economia sempre dependeu não apenas do tamanho do nosso produto interno bruto, mas da abrangência da nossa prosperidade; da nossa capacidade para dar oportunidades a cada alma de boa vontade - não por caridade, mas porque é o caminho mais seguro para o nosso bem comum.
Quanto à nossa defesa comum, rejeitamos como uma falsidade a escolha entre a nossa segurança e os nossos ideais. Os nossos Pais Fundadores, confrontados com perigos que mal podemos imaginar, delinearam uma carta para assegurar o estado de direito e os direitos humanos, uma carta reclamada pelo sangue de gerações. Esses ideais continuam a iluminar o mundo e não desistiremos deles em nome da conveniência. E portanto, a todos os povos e governos que nos estão hoje a ver, desde as grandes capitais à pequena aldeia onde o meu pai nasceu: saibam que a América é amiga de todas as nações e de todos os homens, mulheres e crianças que procuram um futuro de paz e dignidade, e que estamos preparados para liderar uma vez mais.
Recordem que gerações anteriores defrontaram o fascismo e o comunismo não apenas com mísseis e tanques, mas com alianças resolutas e convicções duradouras. Compreenderam que o nosso poder não consegue por si só proteger-nos nem nos confere o direito de fazer o que nos agrada. Pelo contrário, perceberam que o nosso poder aumenta com o seu uso prudente; que a nossa segurança emana da justeza da nossa causa, da força do nosso exemplo, de qualidades como a humildade e a moderação.
Somos os guardiães desse legado. Guiados por estes princípios uma vez mais, podemos estar à altura dessas novas ameaças que exigem um esforço ainda maior - e mesmo maior cooperação e compreensão entre nações. Vamos começar a deixar responsavelmente o Iraque ao seu povo, e a planear uma paz bem merecida no Afeganistão. Com velhos amigos e antigos inimigos, trabalharemos sem descanso para diminuir a ameaça nuclear e repelir o espectro do aquecimento do planeta. Não pediremos desculpa pelo nosso modo de vida nem hesitaremos na sua defesa, e para aqueles que procuram impor os seus objectivos induzindo o terror e massacrando inocentes, dizemos-lhes que o nosso espírito é mais forte e não pode ser dominado; não nos podem vencer pelo cansaço e nós derrotá-los-emos.
Porque sabemos que o nosso património feito de muitos retalhos é uma força, não uma fraqueza. Somos uma nação de cristãos e muçulmanos, de judeus e hindus - e de não crentes. Somos formados por todas as línguas e culturas, atraídas de todos os cantos da Terra; e porque experimentámos o travo amargo da guerra civil e da segregação e emergimos desse escuro capítulo mais fortes e mais unidos, só podemos acreditar que os velhos ódios passarão um dia; que as linhas de divisão se dissolverão em breve; que à medida que o mundo se torna mais pequeno, a nossa humanidade comum se revelará; e que a América tem de desempenhar o seu papel de condutora para uma nova era de paz.
Ao mundo muçulmano, procuramos um novo caminho baseado no interesse mútuo e no respeito mútuo. Aos líderes por esse mundo fora que procuram semear o conflito ou lançar as culpas dos males da sua sociedade ao Ocidente: saibam que o vosso povo vos julgará por aquilo que conseguirem construir, não pelo que destruírem. Para aqueles que se agarram ao poder através da corrupção, da falsidade e do silenciamento da oposição, saibam que estão do lado errado da história; mas que nós vos estenderemos a mão se estiverem dispostos a abdicar.
Aos povos das nações pobres, prometemos trabalhar convosco para que as vossas terras floresçam e para que haja água potável; para dar de comer a corpos esfomeados e alimentar espíritos sedentos. E aos países que como o nosso gozam de uma relativa abundância, dizemos que já não podemos suportar a indiferença perante o sofrimento fora das nossas fronteiras; nem podemos consumir os recursos mundiais sem ter em conta o seu efeito. Porque o mundo mudou e nós temos de mudar com ele.
Ao olharmos o caminho que se estende diante de nós, recordamos com humilde gratidão esses bravos americanos que neste mesmo momento patrulham desertos remotos e montanhas distantes. Eles têm algo a dizer-nos hoje, tal como os heróis caídos que jazem em Arlington nos segredam através do tempo.
Prestamos-lhes homenagem não apenas porque são os guardiães da nossa liberdade, mas porque encarnam o espírito do serviço; uma disposição para encontrar significado em algo maior do que eles próprios. E contudo, neste momento - um momento que definirá uma geração - é precisamente este espírito que deverá habitar cada um de nós.
Porque por muito que um governo possa e deva fazer, é afinal da fé e da determinação do povo americano que este país depende. É a generosidade de receber um estranho quando um dique rebenta, o altruísmo de trabalhadores que preferem reduzir o seu horário do que ver um colega perder o seu posto de trabalho, que nos conduzem nas horas mais sombrias. É a coragem do bombeiro ao abrir caminho por uma escada cheia de fumo, mas também a vontade de um pai para criar um filho, que finalmente decide o nosso destino.
Os nossos desafios podem ser novos. Os instrumentos de que dispomos para os enfrentar podem ser novos. Mas os valores dos quais depende o nosso sucesso - trabalho árduo e honestidade, coragem e justiça, tolerância e curiosidade, lealdade e patriotismo - são velhos. São verdadeiros. Foram a força tranquila do progresso através da nossa história. O que se exige é então um regresso a essas verdades. O que se exige de nós é uma nova era de responsabilidade - um reconhecimento, por parte de todos os americanos, que temos deveres com nós próprios, com o nosso país e com o mundo; deveres que não aceitamos relutantemente mas que cumprimos com alegria, firmes no conhecimento de que não há nada tão compensador para o espírito, tão definidor do nosso carácter, como nos entregarmos inteiramente a uma tarefa difícil.

É este o preço e a promessa da cidadania.
É esta a fonte da nossa confiança - o conhecimento de que Deus nos chama para darmos forma a um destino incerto.
Este é o significado da nossa liberdade e da nossa fé - a razão por que homens, mulheres e crianças de todas as raças e religiões se podem juntar nesta celebração em volta desta magnífica alameda, e por que um homem cujo pai há menos de 60 anos poderia não ter sido servido num restaurante local pode agora estar aqui diante de vós a prestar o juramento mais sagrado.
Portanto, marquemos este dia com a recordação do que somos e do longo caminho que percorremos. No ano do nascimento da América, no mês mais frio, um pequeno grupo de patriotas juntou-se à volta de fogueiras agonizantes nas margens de um rio gelado. A capital fora abandonada. O inimigo avançava. A neve estava tingida de sangue. Num momento em que o resultado da nossa revolução estava mais em dúvida, o pai da nossa pátria ordenou que estas palavras fossem lidas ao povo:
"Que fique dito para o mundo futuro (...) que no Inverno mais profundo, quando nada senão a esperança e a virtude conseguiam sobreviver (...) que a cidade e o país, alarmados por um perigo comum, acorreram para o enfrentar".
América. Diante dos nossos perigos comuns, neste Inverno de provação, lembremo-nos destas palavras intemporais. Com esperança e virtude, vamos desafiar uma vez mais as correntes geladas e suportar as tempestades que vierem. Que possa ser dito pelos filhos dos nossos filhos que quando fomos postos à prova, nos recusámos a permitir que esta jornada terminasse, que não virámos as costas nem vacilámos; e com os olhos fixos no horizonte e com a graça de Deus, levámos por diante essa grande dádiva da liberdade e a entregámos em segurança às futuras gerações.

--------

Juramento de Tomada de Posse
O Juramento de Tomada de Posse Presidencial está descrito na Constituição dos Estados Unidos da América:
"Eu juro (ou declaro) solenemente que executarei fielmente o cargo de Presidente dos Estados Unidos e que preservarei, protegerei e defenderei, o melhor que puder e souber, a Constituição dos Estados Unidos da América."
A frase "Assim Deus me ajude" não consta da Constituição, mas todos os Presidentes eleitos a disseram no final do juramento, seguindo assim os passos de George Washington.
Franklin Pierce e Herbert Hoover foram os únicos Presidentes eleitos que usaram "declarar" em vez de "jurar" quando proferiram o texto da tomada de posse.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Eu Vim de Longe

Quando o avião aqui chegou
Quando o mês de maio começou
Eu olhei para ti
Então entendi
Foi um sonho mau que já passou
Foi um mau bocado que acabou
Tinha esta viola numa mão
Uma flor vermelha na outra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a fronteira me abraçou
Foi esta bagagem que encontrou
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
Pra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E então olhei à minha volta
Vi tanta esperança andar à solta
Que não hesitei
E os hinos cantei
Foram feitos do meu coração
Feitos de alegria e de paixão
Quando a nossa festa se estragou
E o mês de Novembro se vingou
Eu olhei pra ti
E então entendi
Foi um sonho lindo que acabou
Houve aqui alguém que se enganou
Tinha esta viola numa mão
Coisas começadas noutra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a espingarda se virou
Foi pra esta força que apontou
E então olhei à minha volta
Vi tanta mentira andar à solta
Que me perguntei
Se os hinos que cantei
Eram só promessas e ilusões
Que nunca passaram de canções
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
Quando eu finalmente eu quis saber
Se ainda vale a pena tanto crer
Eu olhei para ti
Então eu entendi
É um lindo sonho para viver
Quando toda a gente assim quiser
Tenho esta viola numa mão
Tenho a minha vida noutra mão
Tenho um grande amor
Marcado pela dor
E sempre que Abril aqui passar
Dou-lhe este farnel para o ajudar
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou p´ra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E agora eu olho à minha volta
Vejo tanta raiva andar a solta
Que já não hesito
Os hinos que repito
São a parte que eu posso prever
Do que a minha gente vai fazer
Eu vim de longeDe muito longe
O que eu andei prá aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar

-
Vim de Longe
Composição: José Mário Branco

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Queixa das Almas Jovens Censuradas

Dão-nos um lírio e um canivete
E uma alma para ir à escola
Mais um letreiro que promete
Raízes, hastes e corola

Dão-nos um mapa imaginário
Que tem a forma de uma cidade
Mais um relógio e um calendário
Onde não vem a nossa idade

Dão-nos a honra de manequim
Para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos um prémio de ser assim
Sem pecado e sem inocência

Dão-nos um barco e um chapéu
Para tirarmos o retrato
Dão-nos bilhetes para o céu
Levado à cena num teatro

Penteiam-nos os crâneos ermos
Com as cabeleiras das avós
Para jamais nos parecermos
Connosco quando estamos sós

Dão-nos um bolo que é a história
Da nossa historia sem enredo
E não nos soa na memória
Outra palavra que o medo

Temos fantasmas tão educados
Que adormecemos no seu ombro
Somos vazios despovoados
De personagens de assombro

Dão-nos a capa do evangelho
E um pacote de tabaco
Dão-nos um pente e um espelho
Pra pentearmos um macaco

Dão-nos um cravo preso à cabeça
E uma cabeça presa à cintura
Para que o corpo não pareça
A forma da alma que o procura

Dão-nos um esquife feito de ferro
Com embutidos de diamante
Para organizar já o enterro
Do nosso corpo mais adiante

Dão-nos um nome e um jornal
Um avião e um violino
Mas não nos dão o animal
Que espeta os cornos no destino

Dão-nos marujos de papelão
Com carimbo no passaporte
Por isso a nossa dimensão
Não é a vida, nem é a morte

Composição: Natália Correia

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Cambalache


Cambalache
Que el mundo fue y será una porquería,
ya lo sé;
en el quinientos seisy en el dos mil también;
que siempre ha habido chorros,maquiavelos y estafaos,contentos y amargaos,
valores y dubles,
pero que el siglo veinte es un desplieguede malda’ insolenteya no hay quien lo niegue;
vivimos revolcaos en un merenguey en un mismo lodo todos manoseaos.
Hoy resulta que es lo mismoser derecho que traidor
,ignorante, sabio, chorro,generoso, estafador.
Todo es igual;
nada es mejor;
lo mismo un burro que un gran profesor.
No hay aplazaos, ni escalafón;
los inmorales nos han igualao.
Si uno vive en la imposturay otro roba en su ambición,
da lo mismo que si es cura,
colchonero, rey de bastos,
caradura o polizón.
Que falta de respeto,
que atropello a la razón;
cualquiera es un señor,
cualquiera es un ladrón.
Mezclaos con Stavisky,van Don Bosco y la Mignón,
don Chicho y Napoleón,Carnera y San Martín.
Igual que en la vidriera irrespetuosade los cambalachesse
ha mezclao la vida,
y herida por un sable sin remachesves llorar la Biblia contra un calefón.
Siglo veinte, cambalacheproblematico y febril;
el que no llora, no mama,
y el que no afana es un gil.
Dale nomás, dale que vá,
que allá en el horno nos vamo a encontrar.
No pienses mas, echate a un lao,
que a nadie importa si naciste honrao.
Que es lo mismo el que laburanoche y día como un buey,
que el que vive de los otros,
que el que mata o el que curao esta fuera de la ley.
---

quarta-feira, 16 de julho de 2008

21 a 26 de Junho 2008 ICAN


Editoras representadas no ICAN
--/--
BARKUHUIS PUBLISHING
EGBERT FORSTEN PUBLISHING
EDIÇÕES COSMOS
CAMBRIDGE UNIVERSITY PRESS
YALE UNIVERSITY PRESS
UNIVERSITY CALIFORNIA PRESS
--/--
FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN
21 DE Junho a 26 de Junho 2008

segunda-feira, 30 de junho de 2008

A nossa Vida! (?)


Às vezes se te lembras procurava-te
retinha-te esgotava-te e se te não perdia
era só por haver-te já perdido ao encontra-te
Nada no fundo tinha que dizer-te
e para ver-te verdadeiramente
e na tua visão me comprazer
indispensável era evitar ter-te
Era tudo tão simples quando te esperava
tão disponível como então eu estava
Mas hoje há os papéis há as voltas a dar
há gente à minha volta há a gravata
Misturei muitas coisas com a tua imagem
Tu és a mesma mas nem imaginas
como mudou aquele que te esperava
Tu sabes como era se soubesses como é
Numa vida tão curta mudei muito
que é com certo espanto que no espelho de manhã
distraído diviso a cara que me resta
depois de tudo quanto o tempo me levou
Eu tinha uma cidade tinha o nome de madrid
havia as ruas as pessoas o anonimato
os bares os cinemas os museus
um dia vi-te e desde então madrid
se porventura tem ainda para mim sentido
é ser a solidão que te rodeia a ti
Mas o preço que pago por te ter
é ter-te apenas quanto poder ver-te
e ao ver-te saber que vou deixar de ver-te
Sou muito pobre tenho só por mim
no meio destas ruas e do pão e dos jornais
este sol de janeiro e alguns amigos mais
Mesmo agora te vejo e mesmo ao ver-te não te vejo
pois sei que dentro em pouco deixarei de ver-te
....
Vejo-te agora vi-te ontem e anteontem
e penso que se nunca a bem te vejo
se fosse além de ver-te sem remédio te perdia
Mas eu dizia que te via aqui e acolá
e quando te não via dependia
do momento marcado para ver-te
...
por isso mais te via do que ao ter-te à minha frente
Mas sabia e sei que um dia não virás
que até duvidarei se tu estiveste onde estiveste
ou até se exististe ou se eu mesmo existi
pois na dúvida tenho a única certeza
Terá mesmo existido o sítio onde estivemos?
...
Passamos como tudo sem remédio passa
e um dia decerto mesmo duvidamos
dia não tão distante como nós pensamos
se estivemos ali se madrid existiu
Se portanto chegares tu primeiro porventura
alguma vez daqui a alguns anos
junto de califórnia vinte e um
que não te admires se olhares e me não vires
Estarei longe talvez tenha envelhecido
terei até talvez mesmo morrido
Não te deixes ficar sequer à minha espera
...
Nada penses ou faças vai-te embora
tu serás jovem como agora
tu serás sempre a mesma fresca jovem pura
que alaga de luz todos os olhos
que exibe o sossego dos antigos templos
e que resiste ao tempo como a pedra
que vê passar os dias um por um
que contempla a sucessão da escoridão e luz
...
que embora tudo mude nunca muda
ou se mudar que se não lembre de morrer
ou que enfim morra mas que não me desiluda
Dizia que ao chegar se olhares e me não vires
nada penses ou faças vai-te embora
eu não te faço falta e não tem sentido
esperares por quem talvez tenha morrido
ou nem sequer talvez tenha existido


in Rui Belo

sábado, 14 de junho de 2008

A ABORDAGEM DOS MEDOS E DA RUPTURA

MULHER DESAPARECIDA A SUL, de Modesto Navarro Que nos amamos pouco e mal, todos o sabemos. Por vezes, amargamente o sabemos. Garrett avisou-nos, mas de pouco nos serviu. Continuamos, sobranceiros e diligentes, a ignorarmo-nos mutuamente. Conseguimos amar o que nos chega de fora, a assimilar acrítica e devotadamente, todos os subprodutos que os impérios mediáticos promovem, com mão operativa e marketing agressivo, levando-nos ao consumo desbragado e irracional. Assim, nesta deriva consumista, nos fomos ao longo dos anos (com claros e graves sinais, a partir dos anos 1980) aculturando e transformando numa massa acrítica, consumidores passivos e sentados nas ameias do sofá de todo o género de produtos culturais estranhos, promovidos em caixa alta e primeiras páginas pelos media de serviço. Esquecemos, ou levaram-nos a esquecer, que num mundo globalizado como este em que vivemos, os povos que não assumem a sua identidade cultural, que não respeitam e promovem os seus valores patrimoniais, tenderá a desaparecer no confronto cultural com outros povos. E um povo, para o ser enquanto identidade colectiva, precisa de referentes, de sinais, de raízes. Só nesse confronto se afirmará singular, só impondo a diferença à diversidade global, a nossa identidade cultural nos poderemos afirmar como povo autónomo livre e respeitado no confronto com outras culturas que de há muito perceberam que a verdadeira marca, que a perenidade da sua passagem pelo espaço que nos é comum, passa indubitavelmente pela capacidade e génio criador dos seus povos. Tudo o resto é volátil e de passagem. António Damásio, afirmou, numa conferência realizada na Gulbenkian, que não cabe à matemática moldar o homem ou o seu carácter de cidadão: essa é tarefa primordial e exclusiva da cultura. Só se aprende a andar, andando, escreveu o poeta espanhol António Machado. Os nossos passos, enquanto povo, passam impressivamente pela nossa história política, cultural e artística. Sem esses referentes memoriais, criativos e históricos, perdemos identidade, fundimo-nos sem honra nem glória (e sem previsíveis vantagens económicas) no espaço global das mediocridades normalizadas. Um povo que não ama, não protege, ou não promove a sua Literatura (ou a Música, a Pintura, a Dança, o Património, a História) se não está morto está, certamente, moribundo. Sábio aviso de mestre Almeida Garrett. A Literatura, aquela que ficcionalmente nos conta (e há, por muito que a tentem apagar, uma história recente que a ficção portuguesa precisa de contar de forma escorreita e asseada, para que se não dilua no cortejo infamante de todos os revisionismos oportunistas que por aí pululam, tendentes a criar o caldo de cultura necessário à desforra que almejam), precisa de se afirmar, de se mostrar, de se impor. Depois dos desvarios que uma escrita soporífera inculcou no nosso tecido editorial (território escasso, como sabemos, onde a iliteracia campeia ufana, sector vivendo à míngua e em permanente crise e por isso permeável a todas as golpadas e aos mais inconfessáveis desígnios), uma escrita mais séria, mais reflexiva e esteticamente sedutora, começa a emergir e a fixar públicos. Neste panorama promissor, é justo salientar o nome de José Casanova que à ficção portuguesa trouxe, em três livros incontornáveis, a memória do país que fomos entre os anos 30 e meados dos anos 70 do século 20, mas igualmente José Saramago com esse brilhante romance que é Levantado do Chão., sinfonia maior da nossa escrita contemporânea. Os anos que se seguiram à revolução de Abril de 1974, trouxeram, para além da liberdade democrática, de uma reformulação nas relações de trabalho, das melhorias sensíveis das condições económicas e do geral acesso à cultura e ao ensino, transformações profundas na organização estrutural das relações entre géneros: a mulher emancipava-se, competia com o homem no mundo do trabalho, começava a frequentar, e a afirmar-se, em número cada vez mais crescente, no território académico. Saíamos de uma sociedade patriarcal, opressora, fortemente dominada pelo homem nos aspectos mais elementares da vida quotidiana, para a súbita descoberta do outro, da identidade e da singularidade do outro – o homem descobria, com alguma perplexidade inicial, que a sua companheira não era apenas a fada do lar que décadas de obscurantismo salazarista haviam formatado nos imaginários comportamentais dos portugueses, mas era um ser autónomo, criativo, exigente e insubmisso. A esposa da Carta Guia de Casados de D. Francisco Manuel de Melo, cujos contornos essenciais permaneceram imutáveis na sociedade portuguesa desde 1650 (data da publicação do texto de Francisco Manuel de Melo), até aos anos 1960, (1) desmoronara-se no tempo veloz de uma (1) – Nos anos 1940, sob a égide dos conceitos de Família de Salazar, o proto-fascista Luís Carreira, publica o livro Namoro e Casamento, autentico Guia de Casados do Estado Novo. década. Entre nós, e por força de uma opressão vigilante, atenta aos mais ínfimos sinais dos auto denominados bons costumes e fidelidade conjugais, fidelidade que os decantados “bons costumes” apenas impunham à metade mais frágil, as primeiras manifestações públicas do feminismo iniciam-se, de forma corajosa, com Maria Lamas nas páginas da revista Modas e Bordados e nesse estudo fundamental que é Mulheres do Meu País, alcançando em 1971, com a publicação das Novas Cartas Portuguesas, de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta, uma maior visibilidade, graças ao mediatismo que as suas autoras conseguiram junto da comunicação social – aproveitando, claro, a fugaz abertura da primavera marcelista. Há escritores que transportam aos ombros – muito para além da argamassa das memórias da vida e do vivido com que estruturam os textos – o peso do social que transparece acutilante na sua escrita. Sartre chamou-lhe engagement, chamar-lhe-ei, para uma mais fácil compreensão, uma escrita comprometida com a história e com o pulsar do seu tempo: uma literatura sem embustes. Mesmo quando o autor, pelo rigor e mestria do seu laboratório literário, consegue elidir essa particularidade, ela está impressa no texto, é indissociável do estilo, do diegético que atravessa a obra. Encontramos este comportamento narrativo nas obras mais recentes de Urbano Tavares Rodrigues, mesmo quando o autor, aparentemente, só nos quer falar das degenerescências comportamentais que atravessam e inquinam a vida nas sociedades contemporâneas: só que essa degenerescência não acontece por acaso, não surge do nada – há razões sociais e políticas que contaminam os comportamentos, que inoculam os vazios, a solidão, o desencanto, a desesperança, a usura: uma espécie de húmus que subterraneamente nos vai tomando por dentro e invade o espaço colectivo. O comprometimento social, esse crítico e arguto olhar sobre o real, não é descoberta dos autores portugueses contemporâneos. Já Fernando Pessoa, pegando pelo lado menos sórdido do modernismo definido por Marinnetti, anunciava que as grandes depressões sociais e políticas são terreno fértil para o aparecimento da grande literatura e que esta, pela sua genialidade poderá influir nos destinos da humanidade. Aparte a sebastianica assumpção pessoana, o certo é que a literatura que denunciou e tomou partido no coro das denúncias dos atropelos dos poderes em relação aos direitos fundamentais da condição humana, foi determinante para influenciar vastas camadas da opinião pública que, a partir de alguns textos fundamentais, começou a olhar criticamente a realidade circundante e a indignar-se de maneira mais consciente e activa. Aconteceu com John Steinbeck, ao inscrever a dor e as feridas que a grande depressão imprimira no tecido social americano, também com John dos Passos, denunciando uma sociedade estruturalmente corrupta e o capitalismo como um sistema decadente arvorado em civilização, na generosidade militante e combativa de Hemingway, Zola, Gorky, Calvino, Morávia, Brecht, os portugueses que protagonizaram a primeira incursão neo-realista, Soeiro Pereira Gomes, Ferreira de Castro, Alves Redol, Manuel da Fonseca. E a geração que, embora solidária com algumas questões suscitadas pelo neo-realismo, se deixaram seduzir pelos movimentos estético-literários emergentes no mundo anglo-saxónico e, sobretudo, em França: José Cardoso Pires, Vergílio Ferreira, Augusto Abelaira, José Saramago, Urbano Tavares Rodrigues e, já nos anos setenta do século XX, a geração que foi à guerra e sofridamente no-la revelou: Modesto Navarro, Lobo Antunes, João de Melo, Fernando Assis Pacheco, Manuel Alegre, Álamo Oliveira e eu próprio. A esta geração que foi à guerra e voltou, depois do exercício catártico de a dizer (e não será estulticia afirmar que essa literatura é já hoje um sub-género literário que cada vez mais se afirma pujante na história recente da nossa ficção, com novos e interessantes títulos recentemente publicados, entre os quais salientamos Diário da Guiné 1968/69, de Mário Beja Santos) ficou-lhe o espaço de uma revolução para reflectir e sobre ela efabular. Poucas gerações como a nossa se poderão regozijar de terem atravessado tão prodigioso período histórico, tendo vivido e sofrido tão extraordinárias e díspares experiências, que vão da mais ultramontana repressão, à censura bacoca, ao sórdido dos anos da guerra, até aos dias absolutos e solares do nosso júbilo libertário. Um manancial único que urge aproveitar e reinventar criativamente. O nosso mais recente cinema começa a reflectir esta realidade que a literatura, pelos constrangimentos conhecidos, tarda em assumir. Modesto Navarro, desde esse cáustico romance do começo do nosso desencanto que é A Meio da Ponte, romance onde o autor assume o retrato triste, por vezes nostálgico, de uma geração que tentou mudar os rumos da história e verifica, angustiada e incrédula, olhando ao espelho o esbranquiçar da gaforina, ou a sua total ausência, que nem a si, ou aos próximos, conseguiu mudar substantivamente. Ora, a angústia que atravessa A Meio da Ponte, muda-se com armas, bagagem e refinamento de processos, para esta nova novela do autor de O Coração da Terra. Modesto Navarro consegue na novela Mulher Desaparecida a Sul, um ritmo consentâneo com o objecto narrado, um eixo de similaridades até então ausentes, ou só a espaços verificáveis na sua escrita. Há uma suspensão nos modos desta fala, uma interioridade sensível, a lenta descida ao âmago das nossas indescobertas feridas interiores. Nesta novela é o homem que arrasta a suprema humilhação de se saber rejeitado, o homem a quem a ruptura fere como um ultraje insuportável, até à violência que o ciúme incendeia. João é o retrato de um tempo insubmisso, vítima, se quisermos, da volatilidade das relações entre homem e mulher, do efémero da paixão, a que a liberdade veio, de forma crua e violenta, tirar a máscara hipócrita que as pretendia eternizar no limbo da paciência, por que Deus é misericordioso e compensa com juros, galáxias celestiais e brancas asas do paraíso quem na terra sofra infernos e ultrajes. Estamos, neste terreno dos afectos, cada vez mais sós e responsáveis únicos pelos nossos actos: daí a angústia sem remissão. João permanece apaixonado por Elisa mas ela já não o ama, precisa de espaço, diz-lhe, um outro espaço onde possa finalmente afirmar-se em plenitude, ser plenamente – estranha e insuportável rebeldia, vinda de uma mulher ainda ontem submissa, ainda ontem partilhando sonhos, dificuldades, um filho, a vida – mas o futuro é o tempo que passa, é o momento único e irrepetível que vivemos, e o amor só é eterno enquanto dura, como escreveu o Vinícius que do amor e da sua efemeridade sabia tanto como de um bom uísque de malte. Maria Lamas, em Mulheres do Meu País, já decifrara esse purgatório das frustrações ocultadas, que Modesto Navarro inscreve neste livro. “Ao debruçar-se sobre a vida doméstica (“oásis onde – segundo Salazar – os filhos de Portugal são formados”), Maria Lamas encontra não o santo equilíbrio de que os salazaristas e outros conservadores faziam o panegírico, mas um sistema fechado sobre si mesmo que tendia à amargura e ao inevitável desgaste dos mais fortes afectos”. (1) É deste purgatório tolhedor que Elisa tenta, em ruptura, escapar. (1) – Maria João Martins – O Paraíso Triste – Pág. 119 - Ed. Vega O triângulo amoroso completa-se com Eduardo, que ama Elisa e a quem ela se entrega mais por necessidade de fuga a um quotidiano sufocante do que por verdadeiramente o amar. Elisa é uma mulher em busca do seu espaço, da sua identidade, do seu lugar: essa busca é obsessiva e não deixa lugar no peito para as amarras da paixão. Por isso, sabedora dessa impossibilidade, Elisa desaparece algures numa praia do sul, ou morreu de intoxicação alimentar – suspensão e dúvida, o leitor que conclua que para isso foi convocado e se fez cúmplice. Com Eduardo regressamos ao imaginário mais impressivo de Modesto Navarro, às suas memórias da terra transmontana, à vila, à oficina, ao espaço dos afectos primordiais. E é no contar as estórias desse espaço, no sensível diegético que as enforma, que esta fala se alarga e ganha asas, é mordente e tocante de clamor e êxtase, como acontece em algumas das melhores páginas de O Coração da Terra. Modesto, para nosso contentamento, traz o coração atravessado dessas memórias e no-las vai vertendo, com parcimónia que roça a timidez, ao longo das páginas da sua já considerável obra. Com esta novela, o autor de Seis Mulheres na Madrugada, regressa à análise das relações dos casais no Portugal pós 25 de Abril de 1974. Modesto Navarro, serve-se de uma estrutura narrativa próxima do policial (género em que o autor se movimenta dextro), para nos falar das relações falhadas (tema já abordado em A Insubmissa) da angústia e dos medos que perpassam este nosso tempo e tocam uma geração que se sente à deriva e desapossada de referentes identitários num país que, depois da esperança e da solidariedade libertária, enfrenta desarmada e confusa a cupidez neo-liberal. Mulher Desaparecida a Sul, é uma novela construída sobre os estilhaços do desencanto e dele o autor, com um despojamento narrativo exemplar, na forma como as elipses se estruturam (há algo de faulkeleriano neste modo de contar) traça um impressivo, nostálgico e arrebatado retrato. Mulher Desaparecida a Sul é, portanto, uma novela vigorosa e sensível, abordando os nossos medos face a um mundo que desaba e do qual não sabemos prever o futuro que virá. A vida e seus inumeráveis segredos. Brilhante começo de uma nova colecção da Cosmos, que se assume como biblioteca onde os autores portugueses de referência poderão encontrar espaço para a publicação de textos que expressem as profundas inquietações deste nosso tempo.
in; Domingos Lobo

terça-feira, 10 de junho de 2008

São os loucos de Lisboa


Parava no café quando eu lá estava
Na voz tinha o talento dos pedintes
Entre um cigarro e outro lá cravava a bica, ao melhor dos seus ouvintes
As mãos e o olhar da mesma cor
Cinzenta como a roupa que trazia
Num gesto que podia ser de amor
Sorria, e ao partir agradecia
São os loucos de Lisboa
Que nos fazem duvidar
A Terra gira ao contrário
E os rios nascem no mar
Um dia numa sala do quarteto
Passou um filme lá do hospital
Onde o esquecido filmado no gueto
Entrava como artista principa
lCompramos a entrada p'ra sessão
Pra ver tal personagem no écran
O rosto maltratado era a razão
De ele não aparecer pela manhã
Mudamos muita vez de calendário
Como o café mudou de freguesia
Deixamos de tributo a quem lá pára
Um louco a fazer-lhe companhia
E sempre a mesma posse o mesmo olhar
De quem não mede os dias que vagueam
Sentado la continua a cravar
Beijinhos as meninas que passeiam.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Aconteceu-me do Alto do Infinito

Aconteceu-me do alto do infinito
Esta vida.
Através de nevoeiros,
Do meu próprio ermo ser fumos primeiros,
Vim ganhando, e través estranhos ritos
De sombra e luz ocasional, e gritos

Vagos ao longe, e assomos passageiros
De saudade incógnita, luzeiros
De divino, este ser fosco e proscrito...
Caiu chuva em passados que fui eu.

Houve planícies de céu baixo e neve
Nalguma cousa de alma do que é meu.
Narrei-me à sombra e não me achei sentido.

Hoje sei-me o deserto onde Deus teve
Outrora a sua capital de olvido...

Fernando Pessoa

terça-feira, 29 de abril de 2008

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Trova do Vento que Passa




Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraçao
vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das água
se os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.

Levam sonhos deixam mágoa
sai rios do meu país
minha pátria à flor das águas
para onde vais? Ninguém diz.

Se o verde trevo desfolhas
pede notícias e diz
ao trevo de quatro folhas
que morro por meu país.

Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio é tudo o que tem
quem vive na servidão.

Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.

E o vento não me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.

Vi minha pátria na margem
dos rios que vão pró mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.

Vi navios a partir

(minha pátria à flor das águas)
vi minha pátria florir

(verdes folhas verdes mágoas).
Há quem te queira ignorada

e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificadanos braços negros da fome.

E o vento não me diz nada
só o silêncio persiste.
Vi minha pátria parada
à beira de um rio triste.

Ninguém diz nada de novo
se notícias vou pedindo
nas mãos vazias do povo
vi minha pátria florindo.

E a noite cresce por dentro
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.

Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.

poema de Manuel Alegre
imagen de Antonio Almeida Felizes

segunda-feira, 14 de abril de 2008

A Europa, obra de paz


A Europa, obra de paz e de reconciliação, nunca tentou afirmar a sua posição no mundo, depois da segunda Guerra Mundial, a não ser através da exemplaridade dos seus sistemas de arbitragem.
À medida que o seu peso económico e comercial foi crescendo, a União Europeia passou a ser solicitada no sentido de desempenhar o seu papel de potência mediadora e de força de equilíbrio no mundo.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

11 de Abril de 1918, La Lys - 90 Anos depois


Batalha de La Lys, cemitério de Richebourg em França



quinta-feira, 10 de abril de 2008

Ai se mestre Gil, cá viesse

A formiga no carreiro
Vinha em sentido cantrário
Caiu ao Tejo
Ao pé dum septuagenário
Larpou trepou às tábuas
Que flutuavam nas àguas
E de cima duma delas
Virou-se prò formigueiro
Mudem de rumo
Já lá vem outro carreiro
A formiga no carreiro
Vinha em sentido diferente
Caiu à rua
No meio de toda a gente
Buliu buliu abriu as gâmbias
Para trepar às varandas
E de cima duma delas
Virou-se prò formigueiro
Mudem de rumo
Já lá vem outro carreiro
A formiga no carreiro
Andava a roda da vida
Caiu em cima
Duma espinhela caída
Furou furou à brava
Numa cova que ali estava
E de cima duma delas
Virou-se prò formigueiro
Mudem de rumo
Já lá vem outro carreiro

Poema de Zeca Afonso

domingo, 6 de abril de 2008

Vergonha


O último relatório da ONU diz que 2% da população do mundo detém 50% da riqueza do planeta TERRA.


"Aquele que não conhece a verdade é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso"
Bertold Brecht

terça-feira, 1 de abril de 2008

quinta-feira, 27 de março de 2008

john wolf


O Livro " Portugal Traduzido" será sem dúvida um livro de excelência que a as Edições Cosmos, apresentarão no dia 9 de maio de 2008 às 21 horas, na Tertúlia " Poiso do Besouro" na Chamusca.
Acção critica ao nosso país visto por um Norte Americano radicado no nosso país à mais de uma década.
Sessão de apresentação a não perder

terça-feira, 25 de março de 2008

Congresso Internacional Romance Antigo

Marília P. Futre Pinheiro

Chair of the Organizing Committee of ICAN IV - International Conference on the Ancient Novel that will be held from 21 to 26 July 2008 in Lisbon, Portugal


Marília P. Futre Pinheiro - Edições Cosmos,
Editor-in-chief, "Labirintos de Eros"
(Portuguese translations of the Ancient Greek Novels), Lisboa.