domingo, 9 de março de 2008

Beleza, solidão e morte


Esta fotografia de John Moore, da Getty Images, apareceu na capa do New York Times no Memorial Day – dia que os americanos dedicam a lembrar os entes queridos que morreram em combate. Tirou-a na secção 60 do Arlington National Cemetery a 27 de Maio deste ano. Esta é uma secção do cemitério preenchida apenas pelas campas dos que tombaram no Iraque e no Afeganistão.A rapariga da foto chama-se Mary MacHugh e encontrava-se junto à campa do noivo, o sargento James J. Regan, 26 anos, morto a 9 de Fevereiro quando um engenho explosivo detonou perto do carro-patrulha em que seguia, algures numa estrada no norte do Iraque.John Moore, o fotógrafo, esteve durante mais de cinco anos em zonas de combate, tanto no Iraque como no Afeganistão. «Vi o pior que alguém pode ver: o ódio, a raiva, a desolação e o desespero, muitas mortes, tanta destruição» e, por fim, referindo-se a esta foto, «uma jovem rapariga chorando o seu amor perdido para sempre».A foto correu mundo: capta muito bem a dor da perda, a destruição dos sonhos e dos planos de uma jovem pela infame estupidez da guerra. A forma como ela se encontra sozinha no cemitério, rodeada de dezenas de tumbas de mármore, lembra-nos a solidão que todos os seres vivos devem sentir perante a morte. Descalçou os sapatos, deitando-se sobre a campa do noivo como se o quisesse abraçar – é um momento muito íntimo.Há quem considere que o sucesso desta fotografia tem a ver com a sua carga erótica. Jerry Monaco, uma das estrelas do Live Journal, descreve no seu blogue o poder de manipulação desta imagem: «Se em vez de uma jovem bonita, o fotógrafo tivesse captado uma mãe gorda de meia-idade deitada com os pés descalços chorando a perda do filho, a foto não teria metade do impacto e provavelmente nem sequer chegaria à capa do New York Times». Monaco considera esta foto um exemplo do que chama «luto sexualizado». Explica que a foto segue a tendência de um certo tipo de arte do século passado (pinturas e esculturas) nas quais nos é apresentada uma ligação entre morte e beleza.Haverá realmente uma carga sexual neste foto? Digam de vossa justiça. Não lhe vemos a cara, é verdade – o que significa que é a nossa imaginação que se encarrega de lhe dar um rosto. Temos então uma mulher jovem, elegante, frágil, exposta. Não inspirará um certo tipo de ternura lânguida?

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